IX - Perguntas freqüentes

 

 

 

1) Os caraítas crêem que todo o conteúdo no Talmude está equivocado?

 

 

Não: Afirmar que cada interpretação contida no Talmude está equivocada seria o mesmo que afirmar que uma determinada visão está equivocada simplesmente por ser dos Caraítas. Este não é um procedimento apropriado de debate, nem conduz a encontrar a verdade que há atrás de alguns assuntos tratados no Tanach. Ao avaliar uma interpretação, deve-se olhar a interpretação ao invés da pessoa que mantém tal interpretação. Sendo assim, é apropriado dizer que devemos olhar a mensagem e não ao mensageiro. Por outro lado, ler o Talmude e considerá-lo como a palavra final em relação aos problemas que baralharmos é inaceitável especialmente porque constantemente o Talmude tira conclusões desprovidas de apoio Bíblico.

 

2) Como é que os Caraítas discordam das interpretações dos milhares de Rabinos que têm lido a Bíblia e das palavras do Talmude que têm resistido a prova do tempo?

 

O número de Caraítas ou Rabanitas que sustentam uma determinada opinião não é importante se a opinião está equivocada. Uma pergunta similar pode ser feita sobre o porquê os Judeus escolhem não aceitar a Jesus quando tantos Cristãos o fazem. Certamente, nenhum Rabino mudará suas crenças simplesmente porque, em relação à população mundial, os Cristãos superam em número aos Judeus. Além disso, a existência/sobrevivência de um texto não é prova de veracidade. Sua capacidade para superar a prova do tempo normalmente não é um bom indicio para que alguém deva extrair princípios de vida que sirvam de guia. O fato de que o Talmude estivera durante muito tempo no Judaísmo Rabínico não deve convencer a ninguém de sua
autenticidade como palavra de Deus. O Novo Testamento Cristão tem sobrevivido durante 1900 anos e é inclusive mais velho que o Talmude!  Mas apesar disto nenhum Rabino o aceitaria como "a verdade" somente porque tem sobrevivido durante tantos séculos.

 

3) Os Caraítas são considerados Judeus?

 

Sim: Os Caraítas crêem em um Deus, na origem divina dos 24 livros da Bíblia Hebraica, e na vinda de um Messias. Os Caraítas são reconhecidos como Judeus pelo estado de Israel. Além disso, cada israelita tem um cartão de identidade e neste cartão de identidade está registrada a afiliação religiosa/étnica do possuidor. O cartão de identidade que pertence a um Caraíta registra "Judeu" no espaço reservado para sua afiliação religiosa/étinica. Os Caraítas também são beneficiados pelo Direito Israelita de Retorno - o direito de todos os Judeus onde quer que residam, de voltar para Israel e obter a cidadania imediatamente-. Recentemente o governo de Israel publicou um selo em honra dos Judeus Caraítas.

 

Os inexoráveis seguidores da tradição Rabínica, no entanto, defenderão que os Caraítas não são Judeus. Existem duas razões em que eles amparam esta afirmação. Uma é que os Caraítas simplesmente não seguem as "leis" dos Rabinos. A outra é que os Caraítas ao longo da história tenderam a seguir o modelo Bíblico no reconhecimento da genealogia patrilinear - a crença que a condição de Judeu (ou mais especificamente de Israelita) é transmitida através do pai. Os Rabinos, por outro lado, reconhecem a linha matrilinear - a crença que alguém é Judeu se sua mãe é judia. Conseqüentemente, se um homem Caraíta se casasse com uma mulher não judia, os Rabinos não considerariam a criança Judía, enquanto que os Caraítas sim considerariam a criança Judia. *

 

As duas afirmações que os Rabinos fazem ao dizer que os Caraítas não são Judeus são afirmações desafortunadas. Os Caraítas geralmente consideram aos Rabanitas como Judeus e ao invés de focalizar os debates sobre se os Rabanitas são ou não Judeus, os Caraítas colocam sua atenção em alcançar a correta compreensão dos mandamentos da Torah. A mesma divisão que os Ortodoxos têm mostrado ao dizer que os Caraítas não são Judeus também tem guiado as grandes disputas dentro do movimento Rabínico ao se negar a reconhecer aos Reformistas ou inclusive aos Conservadores como Judeus. Para que o movimento Judaico possa avançar em direção a um caminho de unidade e entendimento da Torah, não devemos nos excluir uns aos outros nos chamando de "não Judeus". Ao contrário, em ordem para podermos alcançar uma terra comum, devemos permitir um debate tão livre como for possível em temas relacionados com nossa observância cotidiana como Judeus.

 

Sem levar em conta que certo Caraíta, Rabanita, ou a autoridade política pudesse afirmar sobre quem é Judeu, o modelo Bíblico sugere que qualquer que 1) se circuncida [somente os varões], 2) aceita ao Deus de Israel como seu próprio Deus, e 3) aceita ao Povo de Israel como seu próprio Povo é um autêntico Judeu [Israelita]. (Veja em Êxodo 12:43-49 e Rute 1:16).

 

4) Os Caraítas seguem a Bíblia literalmente?

 

Não: Como se tem dito nas passagens do inicio, cada palavra da Torah (e inclusive de toda a Bíblia Hebraica) está sujeita a interpretação.

 Esta interpretação deve estar, todavia de acordo com o resto da Bíblia e também deve estar de acordo com o claro significado do texto que estivera disponível ao Israelita comum no momento do recebimento da Torah. De fato, existem exemplos onde são os Rabinos que fazem uma interpretação "literal" dos mandamentos enquanto que os Caraítas sempre os entenderam com um sentido "metafórico". (Veja: Exegese Caraíta: Tefillin e Mezuzot. Um Exemplo Prático). Lemos em Deuteronômio 31: 12-13 que a Torah devia ser lida em cada sétimo ano diante da congregação de todo Israel - homens, mulheres, e crianças-. Em uma era em que os livros escritos eram raros, esta leitura pública era uma fonte primária para aprender a Torah. Em conseqüência, devemos assumir que qualquer interpretação que fizermos de um texto Bíblico, deveria ter sido claríssima para o antigo Israelita presente nessa leitura pública, do contrário essa interpretação não é correta. Isto não exige estendermos uma ponte de 3500 anos no idioma e cultura. Para fazer isto nós devemos estudar em todo o Tanach empregando métodos científicos de Lingüística Hebraica e exegese contextual.

 

 

5) Os Caraítas não têm seus próprios costumes?

 

Sim, mas não passam disto - costumes -. Qualquer Caraíta que tente converter estes costumes em lei está violando o mandamento da Torah que proíbe acrescentar ou subtrair a palavra de Deus. (Deuteronômio 4:2). A mesma afirmação é válida para os Rabanitas que convertem os costumes Rabínicos em lei.

 

 6) Sendo que os Caraítas não têm Rabinos, que título é dado para aqueles que possuem conhecimento do Tanach?

 

Na tradição dos Caraítas, tais pessoas são chamadas de Hakhamim (Homens ou Mulheres Sábios) ou Hakham (Homem Sábio)/Hakhama (mulher sábia). O título de Hakham, ao contrário do de Rabino ou Sacerdote, não denota uma posição clerical, porém indica que alguém alcançou certo nível de conhecimento a respeito do Tanach. Para ser um Hakham, é necessário ter um profundo conhecimento de lingüística, dominar as complexidades do Hebraico Bíblico, e deve manejar com facilidade os diferentes meios para a análise Bíblica. Algo muito interessante é que enquanto os Rabanitas Ortodoxos não permitem que uma mulher se torne Rabina, uma mulher, sim, pode tornar-se Hakhama. De fato, no século 10, muito antes do modernismo, o líder da proeminente e poderosa comunidade Caraíta da Espanha foi uma mulher a quem os Caraítas chamavam "Mestre [al-Mualema]".

 

7) Não é verdade que Anan ben David (Hanasi) inventou o Caraísmo no século 8º?

 

Como foi dito na História do Caraísmo, sempre houve uma continuidade de Judeus que não acreditaram no Talmude. Anan deu-lhes simplesmente unidade representando-lhes diante das autoridades muçulmanas. Isto provocou sua liberdade para praticar o Judaísmo ao modo de seus antepassados o qual lhes fora negado previamente sob a perseguição do Exilarcado Rabbanita.

 

8) Os Caraítas acendem as Velas de Shabbat?

 

Não: Os Caraítas sempre creram que não é permitido acender nenhum tipo de fogo no Shabbat. Ao contrário da benção Rabínica que afirma, "Bendito sejas tu, Senhor, nosso Deus, Rei do Universo que nos santificas com Teus mandamentos e nos ordenaste acender as Velas de Shabbat", em nenhuma parte da Torah escrita ou inclusive na "Lei Oral" Rabínica aparece um mandamento que ordene acender as Velas de Shabbat. Todavia a Torah proíbe este ato. Sendo que nos é ordenado não acrescentar ou tirar das palavras da Torah (cf. Deuteronômio 4:2). (Para uma análise técnica deste problema, por favor, leia o Apêndice A.)

 

 

* E vice-versa, se uma mulher Rabanita se casasse com um homem não Judeu, alguns Caraítas não considerariam seus filhos como Judeus.